Para melhor compreender o autismo, é preciso entender os determinantes genéticos e ambientais, seu desenvolvimento, as ideias recebidas que continuam a circundá-lo, como reconhecer suas múltiplas facetas e as melhores estratégias de avaliação e de intervenção que podem ser implantadas.

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Síntese

Editor do Tema: Margaret E. Clarke, MD, University of Calgary, Canadá

Tema financiado por:

CONASS - Conselho Nacional de Secretários de Saúde - Brasil

Qual é sua importância?

O autismo é um transtorno do desenvolvimento de origem desconhecida. Anteriormente era considerado raro e quase sempre grave, mas atualmente é compreendido como mais comum e com formas variáveis de ocorrência. O autismo começa na infância, e afeta uma em cada 200 crianças. Em geral é detectado aos 3 anos de idade e, em alguns casos, já aos 18 meses de vida.1 As taxas de ocorrência distribuem-se desigualmente entre os sexos, com probabilidade quatro vezes maior de manifestação em meninos. 

O autismo caracteriza-se por dificuldades na socialização, na comunicação, no comportamento e na brincadeira. As crianças afetadas por esse distúrbio “mostram deficits em: 1) interação social; 2) comunicação verbal e não verbal; e 3) comportamentos ou interesses repetitivos. Além disso, frequentemente têm respostas pouco usuais a experiências sensoriais, tais como a certos sons ou à aparência dos objetos.1” As capacidades cognitivas de indivíduos autistas variam amplamente. Embora a taxa de retardo mental no autismo seja de aproximadamente 70%, uma porcentagem significativa dos indivíduos situa-se na média de inteligência, e acima dela. Entre 15% e 20% das crianças autistas passam por um período de regressão na fala e no comportamento social entre os 12 e 20 meses.

Embora não tenha sido identificado nenhum gene de suscetibilidade, há evidências de que a condição é herdada. Sabe-se que a taxa de recorrência do autismo em irmãos fica entre 2% e 8%, e distúrbios menos severos em habilidades de comunicação social ou de linguagem são encontrados em até 20% dos parentes. 

O que sabemos? 

O autismo é uma condição orgânica que afeta o desenvolvimento desde muito cedo. Crianças autistas têm dificuldades sócio-emocionais para a utilização de comportamentos não verbais, tais como o contato de olhar, o uso comunicativo de gestos, expressões faciais e posturas corporais. Demonstrar atenção conjunta e empatia parece ser um desafio, uma vez que tendem a preferir atividades solitárias.  

As formas pelas quais os problemas sociais e comunicativos se manifestam variam muito entre as crianças autistas. No entanto, a presença de dificuldades precoces de orientação social, evidenciadas antes dos 24 meses de idade, levou os pesquisadores a concluir que essa é a deficiência primária do autismo. 

É difícil diagnosticar o autismo antes dos 30 meses de vida devido à instabilidade dos diagnósticos nesse período. Um indicador central é a dificuldade no processamento social de rostos, emoções e habilidades de mentalização, e dificuldades na aquisição de habilidades comunicativas. No entanto, por não haver um marcador biológico ou um teste médico para essa condição, e por ser mais complexo medir e analisar indicadores iniciais de comportamento social do que o desenvolvimento de habilidades motoras ou de linguagem, o diagnóstico de crianças pequenas pode ser difícil. Assim sendo, o diagnóstico do autismo baseia-se em informações relatadas pelos pais e em observações do comportamento da criança.  

O que pode ser feito? 

O tratamento do autismo é dificultado pelas amplas diferenças individuais entre as crianças que apresentam o distúrbio, o que dificulta uma intervenção eficaz. Apesar dessas dificuldades, já foi demonstrado que diversos tipos de intervenções intensivas resultam em ganhos significativos no funcionamento cognitivo, social e linguístico de crianças autistas. Por exemplo, a intervenção precoce e intensiva com Análise Comportamental Aplicada (ACA) – uma abordagem que se destina a compreender, avaliar e modificar comportamentos e a ensinar novas habilidades, utilizando diversos métodos baseados em necessidades individuais – resultou, para algumas crianças, em níveis mais altos de desempenho intelectual e educacional. No entanto, a idade e o QI de crianças que recebem a ACA parecem afetar fortemente seus resultados. Outros tipos de intervenção precoce, que oferecem a crianças autistas em idade pré-escolar pistas visuais e estruturas que elas têm dificuldade de produzir sozinhas, também estão associados a níveis mais altos de funcionamento social em algumas crianças. 

A intervenção precoce em contextos escolares inclusivos revelou-se útil para ajudar a melhorar habilidades sociais específicas. Por exemplo, os métodos de ensino da ACA ajudam crianças autistas a aprender a iniciar contatos e responder a outras crianças. Esses métodos também ensinam às crianças habilidades lúdicas específicas e outros comportamentos que contribuem para suas interações com seus pares. Outros métodos instrucionais específicos que são benéficos para a aprendizagem de comportamentos sociais incluem treinamento de respostas relevantes (ensinar comportamentos-chave); remoção gradual do roteiroa (propor à criança um roteiro escrito, sonoro ou pictórico); e dicas atrasadas(esperar antes de oferecer uma resposta à criança). 

É possível separar alguns elementos importantes dos programas de intervenção para crianças autistas em idade pré-escolar. Entre eles:

  • desenvolvimento de habilidades de comunicação (verbal ou não verbal)
  • envolvimento conjunto e atividades sociais conjuntas 
  • promoção de envolvimento e regulação emocional
  • ajuda aos pais para lidar com problemas comportamentais.

Os pais desempenham um papel central nos resultados de intervenções precoces, e os pesquisadores começam a identificar características ou habilidades parentais que podem contribuir para o progresso da criança. A educação parental pode ser um caminho para aliviar os pais e dotá-los de mais recursos, o que pode ajudar a aumentar o impacto da intervenção precoce. A sensibilidade parental – acompanhar o foco de atenção da criança – também foi identificada como um fator importante. 

Uma questão de política social fundamental é desenvolver programas de capacitação para ajudar crianças autistas com quadros mais graves na transição para papéis sociais adultos adaptativos. A intervenção precoce tem boa relação custo-benefício em comparação com o custo do autismo para os indivíduos, as famílias e a sociedade, quando não é oferecido tratamento precoce. Os formuladores de políticas devem dar apoio à identificação e ao tratamento precoces para minimizar as consequências negativas do diagnóstico tardio. Para aumentar o potencial de progressos sociais e de desenvolvimento de crianças autistas, os pesquisadores devem focalizar a melhoria dos métodos confiáveis de identificação do autismo e a compreensão da forma mais eficaz de tratamento para cada tipo de criança, para cada estágio de desenvolvimento e para seus resultados. Além disso, as pesquisas precisam abordar as causas possíveis do distúrbio, tais como transmissão genética e desenvolvimento cerebral. 

Referência

  1. Strock M. Autism Spectrum Disorders (Pervasive Development Disorders).Bethesda, Md: Department of Health and Human Services, National Institute of Mental Health; 2004. NIH Publication No. NIH-04-5511.
a NT: No original, script-fading, também adotado na literatura específica como “esvanecimento de instruções.” No idioma inglês, encontram-se também as expressões fading in e fading out, adotadas em português também como “introdução gradual de estímulo” e “remoção gradual de estímulo” (ou de dica).
b NT: No original, time delay. Também traduzido na literatura brasileira da área por “atraso temporal”. 
 
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Leitura adicional

Quais são as manifestações e os sintomas do autismo?

O autismo aparece desde o primeiro ano de vida com as primeiras manifestações sutis e variáveis que se transformam em sintomas claros por volta dos 2 ou 3 anos de idade e, às vezes, bem mais tarde. As crianças pequenas autistas diferem de seus pares nos seguintes aspectos:

  • Interações sociais: são menos propensas a tomar iniciativa e responder às interações sociais, têm um contato visual limitado e incoerente, apresentam falta de compartilhamento de emoção e de imitação, não respondem quando são chamadas por seu nome. 

  • Comunicação: são menos propensas a utilizar gestos de comunicação e têm dificuldade em repartir atenção.

  • Comportamento sensorial e motor: formas insólitas de olhar ou brincar com os objetos, interesse intenso e pouco usual por alguns objetos ou partes de objetos, ou ainda sensibilidades ou preferências sensoriais não usuais. 

Outras manifestações, como atrasos no desenvolvimento, também são frequentes, mas elas podem se referir igualmente a riscos ligados a outros distúrbios do desenvolvimento.  Os pais e intervenientes deveriam estar bem informados sobre os primeiros sinais do autismo, para que as crianças possam ser tratadas mais cedo e, dessa forma, ter uma evolução mais positiva.

Publicações

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