As políticas de assistência social têm efeitos garantidos sobre as crianças. Embora a reforma desses programas tenha demonstrado efeitos positivos reduzidos e, com certeza, não tenha tido os efeitos negativos previstos, esses efeitos sobre as crianças devem ser levados em consideração nas ponderações políticas.

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Síntese

Tema financiado por:

CONASS - Conselho Nacional de Secretários de Saúde - Brasil

Qual é sua importância?

Em 1996, uma nova legislação norte-americana modificou o sistema de bem-estar social que, de um programa federal de direitos, cedeu lugar a um pacote de transferência de recurso financeiro aos estados, com o objetivo de estimular e exigir dos pais de muito baixa renda que encontrem emprego e os conservem. Em decorrência, aumentou o número de mães solteiras que ingressaram e permaneceram no mercado de trabalho, e as taxas de gravidez na adolescência e de natalidade fora do casamento declinaram. Apenas recentemente foram obtidas algumas evidências sobre os efeitos causais de políticas de bem-estar social sobre as crianças. 

Também no Canadá a responsabilidade por programas de bem-estar social foi transferida para as províncias. Em 1992, foi desenvolvido um estudo canadense – o Self-Sufficiency Project1 – SSP (Projeto de Autossuficiência), com o objetivo de reduzir a pobreza, estimular o trabalho estável e reduzir a dependência em relação ao sistema de bem-estar social. O SSP envolveu nove mil famílias monoparentais em New Brunswick e British Columbia. 

O que sabemos?

Três componentes de políticas caracterizaram os programas de reforma do sistema de bem-estar social: complementação/suplementação de renda, serviços de emprego compulsório e limites de tempo.  Não ocorreram os dramáticos efeitos negativos sobre as crianças que alguns haviam previsto, mas também não ocorreram efeitos positivos consistentes.

Os resultados para bebês e crianças de até dois anos ainda são desconhecidos, embora haja alguns indícios de que o trabalho das mães em tempo integral gera consequências negativas para crianças com menos de 9 meses de idade. A complementação/suplementação de renda, destinada a aumentar emprego e renda, resultou em efeitos modestos, porém positivos, sobre os resultados de desenvolvimento de crianças em idade pré-escolar e no ciclo inicial do ensino fundamental. Esses resultados foram mais consistentes no que concerne ao desempenho escolar e aos escores de testes cognitivos, e parecem manter-se no longo prazo. No entanto, os programas que aumentaram o nível de emprego das mães sem aumentar a renda tiveram efeitos reduzidos e inconsistentes sobre o desenvolvimento social e cognitivo das crianças.

Os efeitos de políticas de bem-estar social – particularmente daquelas que ofereceram complementações/suplementações de renda mais generosas – foram mais acentuados durante dois períodos de transição no desenvolvimento infantil: foram verificados efeitos positivos em crianças que estavam na transição da pré-escola para a terceira infância, e efeitos negativos naquelas que se encontravam na transição da terceira infância para o início da adolescência. Os possíveis fatores que explicam os resultados negativos sobre pré-adolescentes são os comportamentos parentais mais ríspidos, em consequência do estresse das mães no trabalho; o fato de pré-adolescentes precisarem cuidar de irmãos; e o fato de as mães terem menos tempo para supervisioná-los.

De modo geral, os resultados das crianças pobres se alteraram muito pouco em decorrência da reforma do bem-estar social. Estas crianças continuam a apresentar níveis mais baixos de participação na vida escolar e níveis mais altos de problemas comportamentais, quer suas mães tenham ou não acesso ao sistema de bem-estar social. No entanto, filhos em idade pré-escolar de famílias que saíram recentemente dos programas de bem-estar social apresentam os níveis mais altos de problemas comportamentais. Pré-escolares e adolescentes de famílias que sofreram sanções* também apresentam resultados cognitivos e comportamentais problemáticos. O status conjugal, educacional, mental e de saúde física das mães, assim como suas práticas parentais parecem explicar a maior parte das diferenças entre grupos que acessam o bem estar social.

O que pode ser feito?

De maneira geral, políticas de bem-estar social são concebidas para adultos, e pouca atenção é dedicada aos seus efeitos sobre as crianças. No entanto, os impactos (tanto negativos quanto positivos) sobre as crianças devem ser incluídos nos cálculos de custo/benefício.

As políticas de reforma do bem-estar social podem beneficiar as crianças pequenas quando são planejadas de forma a aumentar, ao mesmo tempo, o emprego e a renda de chefes de famílias monoparentais. Para os formuladores de políticas interessados em desenvolver políticas de bem-estar social com o objetivo de melhorar o bem-estar da criança, a suplementação de renda pode ser um complemento importante de programas que visam diretamente à melhoria do desenvolvimento de crianças de baixa renda.

Uma vez que, em consequência das reformas do bem-estar social, é maior o número de pais que dependem de serviços destinados às crianças pequenas, é preciso dedicar maior atenção à qualidade da educação infantil e dos serviços de cuidados na primeira infância, em especial às creches domiciliares, com vistas a favorecer o desenvolvimento infantil e a preparação das crianças para a escola. Esta é uma preocupação importante, tendo em vista que aumenta continuamente o número de crianças pequenas que passam muitas horas sob cuidados alternativos, e devido à qualidade potencialmente baixa e à instabilidade dos serviços de cuidados infantis disponíveis para estas crianças.

Por fim, os formuladores de políticas deveriam se preocupar cada vez mais com os efeitos potencialmente negativos da reforma do bem-estar social sobre os adolescentes, e se concentrar sobre o papel do contexto social e das instituições para essa faixa etária. Pesquisas adicionais sobre os efeitos das políticas de bem-estar social em crianças, ao longo de seus estágios de desenvolvimento, poderiam subsidiar os formuladores de políticas, em seus esforços de compatibilizar orçamento com a oferta de uma rede abrangente e consistente de proteção social para famílias de baixa renda.

Referência

  1. Michalopoulos C, Tattrie D, Miller C, Robins PK, Morris P, Gyamarti D, Redcross C, Foley K, Ford R. Making Work Pay: Final Report on the Self-Sufficiency Project for Long-Term Welfare Recipients. Ottawa, ON: Social Research and Demonstration Corporation; 2002.
* NT: Sanções referem-se à redução ou à eliminação do complemento/suplemento de renda caso o beneficiário não cumpra os requisitos do programa.
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Leitura adicional

Quais são as repercussões dos programas de assistência social sobre as crianças pequenas?

Ao longo dos últimos anos, os programas americanos e canadenses de assistência social foram reformados a fim de encorajar os pais de baixa renda a encontrar empregos e a permanecer ativos no mercado de trabalho.

Os programas que incitam as mães a trabalhar e que melhoram a renda familiar têm baixa repercussão nas crianças com idade entre 2 e 5 anos. Essas repercussões, entretanto, são positivas, especialmente nas habilidades cognitivas, no comportamento, na saúde e no bem-estar familiar. Entretanto, os programas tiveram uma incidência negativa sobre as crianças com menos de nove meses de idade cuja mãe trabalhava em período integral. 

Apesar da reforma dos programas de assistência social, as crianças oriundas de uma família de baixa renda continuam sendo menos bem sucedidas na escola e apresentam mais problemas de comportamento, não importando se sua mãe recebe ou não assistência social. Isso sugere que as políticas de reforma dos programas de assistência social deveriam também ser avaliadas e adaptadas levando em consideração as repercussões que possam ter nas crianças.

Publicações

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